Em minha passagem mais recente por Lisboa, mal via a hora de conhecer o Cantinho do Avillez, de José Avillez, inaugurado no Chiado no início de setembro, marcando o retorno do jovem e festejado chef.
Por três anos, ele esteve à frente do Tavares, um dos ícones da gastronomia lisboeta, que renasceu com sua chegada, conquistando, aliás, uma estrela no Guia Michelin. Porém, no início de 2011, em meio a rusgas já bastante difundidas, o chef deixou a casa.
Bom, voltando ao Cantinho do Avillez, o ambiente não tem pompa. O lugar é despojado, confortável e diminuto – como, presume-se, deve ser um cantinho, embora a atmosfera tenha uma pegada, assim, descolada.
À mesa, nada das espumas ou esferificações de costume – o chef, que domina e pratica a gastronomia de vanguarda, surpreende, aqui, ao propor a simplicidade da cozinha tradicional portuguesa, absolutamente bem executada. No cardápio, as entradas pareceram bastante atraentes. Resolvemos, então, experimentar cinco delas. Isso mesmo, cinco. 🙂
A primeira foi uma porção de peixinhos da horta, um petisco local tradicionalíssimo que se assemelha a peixes fritos mas, na verdade, são vagens de feijão verde cozidas em água salgada e empanadas em seguida. Estavam sequinhos e crocantes, com interior macio, servidos com molho tártaro.
Mas foram as empadinhas as primeiras a arrancar suspiros, com massa fina, de sabor aconchegante. O recheio, farto e cremoso, é preparado com perdiz, bacon e cebolinha.
Mais: fígados de aves tenros chegam à mesa, salteados com uvas e vinho do Porto. A acidez da fruta ajuda a cortar a gordura do fígado, equilibrando a porção. Outra boa pedida.
A hora das vieiras. Os escalopes são fatiados finamente e servidos sobre uma camada de creme de abacate. Uma entrada cheia de frescor. Agradou bastante.
E minha favorita: a farinheira – tradicional embutido português muito semelhante à alheira na origem e no preparo – tem acento defumado que casa harmoniosamente com a generosa crosta dourada de broa e coentro.
Entre os principais, escolhemos um risoto de cogumelos, farto e cremoso, com lascas de parmesão.
Vieiras novamente. Desta vez são servidas acompanhadas por batatas doces de Aljezur (Algarve) e aspargos. Aqui, o sabor da batata doce – sensacional, diga-se de passagem – encobriu um pouco o amargor sutil característico das vieiras. Comprometeu um pouquinho o equilíbrio, mas não foi motivo para impedir elogios.
O hambúrguer de Barrosã DOP veio adornado por foie gras. Para completar, cebolas caramelizadas, com molho umedecendo generosamente o pão macio. Batatas fritas muito crocantes e sequinhas acompanhando. Informal e reconfortante.
Para terminar, uma sobremesa com nome curioso: Avelã 3 – leia-se avelã ao cubo: sorvete e mousse de avelã, finalizados com a fruta seca triturada. Uma combinação de texturas que finalizou ludicamente – e com louvor – o almoço.
Saímos de lá felizes e satisfeitos, rumo à outra casa de Avillez, o Belcanto, com inauguração prevista para novembro. O local, em fase final de reforma, fica a poucos passos do Cantinho e abrigou por 50 anos um dos mais emblemáticos restaurantes de Lisboa, com o mesmo nome.
Na nova casa, sim, será possível reencontrar a cozinha reflexiva praticada por Avillez – sua marca registrada. No menu, ao lado de clássicos do antigo Belcanto, como os ovos à professor e o strogonoff, estarão alguns dos pratos-assinatura do chef, como o Mergulho no Mar, preparado com robalo cozido a baixa temperatura acompanhado por mexilhões e algas, escaldado com água do mar. A localização:
Restaurante histórico com cozinha de vanguarda… Será mera coincidência? Com toda a expectativa em torno da nova casa, já se comenta que o lugar vai nascer de olho na estrela Michelin. Lisboa Merece. E talento para isso não falta.
Vamos aguardar.
Atualização do post: não deu outra, logo no primeiro ano de funcionamento, o Belcanto faturou a primeira estrela Michelin. E hoje, já ostenta duas delas.
Cantinho do Avillez
Rua dos Duques de Bragança, 7
Chiado, Lisboa.
Tel 21 199 2369
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